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O que podemos reflectir com "O Velho e o Mar"


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Ernest Hemingway é um autor que dispensa apresentações de relevo. A sua obra tem sido uma referência, e a distinção como Prémio Nobel de Literatura, em 1954, pode ser considerada um símbolo da sua entrega à arte das palavras.


Com uma obra vastíssima, escolhi o título O Velho e o Mar, que concentra muitas mensagens poderosas às quais é impossível ficar indiferente. Esta obra fala da vida, das dificuldades, dos rótulos que se imprimem nas pessoas e das expectativas que geram nas realizações individuais. Fala, também, da atitude perante as dificuldades e da perseverança, independentemente das ideias preconcebidas. Aborda, ainda, o companheirismo e a amizade, que em tempos de dificuldade podem fazer a diferença na vida de cada um. Alude à vida, do que é e pode ser o ser humano na relação intimista consigo mesmo e com os seus pares no processo da luta quotidiana de fazer acontecer.


O protagonista, Santiago, um velho pescador com uma experiência longa nas artes da pesca, há 84 dias que não consegue pescar um peixe. Tal circunstância gera algum descrédito nas suas capacidades. A história integra, também, Manolin, um jovem que aprendeu com Santiago a arte da pescaria. Este jovem, grato, respeita e incentiva o velho pescador, mesmo quando é impedido pelos seus pais de o acompanhar na pescaria em função do “azar” de nada ser pescado pelo velho.


O livro, de um teor descritivo assinalável, muito ancorado num diálogo interior do protagonista, conta a pescaria levada a cabo, na pequena canoa de Santiago, na manhã do 85º dia. O velho pescador consegue um peixe, de tamanho extraordinário, que oferece feroz resistência e arrasta a canoa para alto-mar. São vivenciadas muitas agruras no decurso da luta com este grande peixe, e só alguns dias depois Santiago consegue, finalmente, dominar o peixe e amarrá-lo à sua canoa. Porém, enquanto retornava a costa, sofre constantes ataques de tubarões.


Quando, por fim, chega à praia, do peixe resta apenas a espinha. Esta evidência estimula e, dir-se-ia, restabelece o reconhecimento e respeito dos restantes pescadores.


O que podemos reflectir:


  • As conquistas diárias nem sempre são imediatas, embora numa sociedade veloz pareça estranho ou sinal de fracasso quando os períodos de tempo se dilatam, levando ao descrédito do valor de quem empreende – “[…] nos primeiros quarenta dias um rapaz fora com ele. Mas após quarenta dias sem um peixe, os pais do rapaz disseram que o velho estava definitivamente e declaradamente «salao», o que é a pior forma de azar […]”.

  • · Os olhos são o espelho da alma e, mesmo em tempos de luta, o brilho no olhar parece ser um sinal de perseverança – “[…] tudo nele e dele era velho, menos os olhos, que eram da cor do mar e alegres e não vencidos […]”.

  • ·A gratidão é um valor que continua a sustentar as relações, e a sua conservação poderia ser um alicerce interessante, mesmo quando as coisas correm de forma menos favorável – “[…] o velho ensinara o rapaz a pescar e o rapaz gostava muito dele […]”.

  • A humildade, tantas vezes desvirtuada entre os notáveis arrogantes, é uma atitude de autoconfiança e de bem-estar individual – “[…] era demasiado simples ele, para ficar-se a pensar ao atingir a humildade. Mas sabia que a atingira e sabia que não era nenhuma desgraça e não acarretava perda do amor-próprio autêntico […]”.

  • Independentemente de haver pares que são exímios naquilo que fazem, o que identifica cada pessoa é a sua essência e o seu carácter único, e isso é o factor diferenciador – “Há alguns pescadores bons e alguns dos grandes. Mas tu és só tu […]”.

  • A experiência e a motivação interna de cada pessoa são âncoras que se reflectem nas várias etapas da vida, com relevância nas situações em que os desafios são audazes – “Posso não ser tão forte como julgo, mas sei muitas manhas e tenho força de vontade […]”.

  • Independentemente do que os outros pensam de nós, é importante o que pensamos de nós mesmos – “Se os outros me ouvissem falar alto, haviam de julgar que eu estava doido. Mas como não estou doido, não me ralo […]”.

  • O diálogo interior é um recurso inesgotável que pode ser convertido em força motriz para as situações em que o desgaste e/ou o desânimo assolam o Ser Humano – “[…] reanima-te, cabeça, reanima-te. Não deves perder a cabeça […]”.

  • As dificuldades fazem parte do ciclo da vida, sendo a atitude e a consciência o que faz a diferença na hora de as encarar e de alavancar energia para prosseguir – “O homem não foi feito para a derrota. Um homem pode ser destruído, mas não derrotado […]”.

  • Embora possa haver uma propensão intrínseca ao Ser Humano para pensar no que não se tem em detrimento do que se tem, há que relembrar que a energia flui para onde está o foco – “Devias ter trazido muitas coisas. Mas não as trouxeste, meu velho. E agora já não é ocasião de pensar no que não tens. Pensa no que podes fazer com o que há […]”.

  • O que é chamado de “sorte” e de “azar” nas concretizações é um constructo individual, e talvez desse entendimento possa depender o processo – “[…] não devo pensar em tolices. A sorte é coisa que vem de muitas formas. Quem sabe reconhecê-la?”.


O quotidiano é preenchido por desafios, e a “pescaria”, aqui entendida em sentido metafórico, nem sempre é diariamente extraordinária. O talento, a experiência, a consciência do objectivo e do propósito, a força interior, abstraída das expectativas e dos comentários depreciativos do contexto, podem resultar em ingredientes influentes.


Termino com a partilha de uma reflexão de Carl Jung: “Eu não sou aquilo que me aconteceu, eu sou aquilo que eu escolho tornar-me.”


📝 Este artigo foi escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico. ✅ Revisão de texto realizada por José Ribeiro

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